sábado, 29 de março de 2014

COSME - Getúlio Alho

Ponto Gê

terça-feira, 18 de março de 2014

COSME
Getúlio Alho

            Uma certa noite de 1964, em Manaus, por volta das oito horas, ao chegar ao Café do Pina – local de encontro diário para a conversa noturna – notei um certo alvoroço entre três ou quatro pessoas que ali estavam. Tomei o tradicional café e me aproximei do grupo que fazia passar de mão em mão um jornal do Rio. O jornal talvez fosse o Correio da Manhã, que  era um dos únicos jornais que ainda se mantinha independente. A notícia era sobre as condições precárias de presos políticos no Rio e trazia a foto de uma folha de caderno escrita a mão. Ao ver a foto não tive dúvida: era a letra do Cosme! E aquela denúncia confirmava a notícia que correu dias antes de que ele havia sido preso no Rio.

            Cosme Alves Netto era um moço discreto, filho de um industrial e político amazonense,  de uma cultura exemplar voltada sobretudo para o cinema. Pouco antes de se mudar para o Rio, acompanhou alguns trabalhos do Clube da Madrugada, como uma exposição de pintura de vários artistas locais e que foi feita no hall de entrada do Teatro Amazonas. Cosme mostrava grande habilidade com o recém lançado pincel atômico fazendo etiquetas com o nome das obras expostas e dos artistas, com uma impecável e perfeita letra de forma. E era essa letra que aparecia na foto do jornal e que nos avisava de sua situação de preso político.
             
             Cosme Alves Netto, então curador da Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio, desenvolvia um trabalho de divulgação de filmes de arte, que atraía um grande número de aficionadas em cinema. Em 1965 tive a oportunidade de ver um de seus trabalhos na Cinemateca do MAM, o ciclo de Cinema Polonês. Pouco depois, Cosme foi um dos idealizadores de uma série de sessões de filmes realizadas num cinema do Catete, cujos frequentadores ficaram sendo conhecidos como geração Paissandu. Esse gosto pelos filmes de arte, ou de filmes que não passavam no circuito comercial, notadamente os vindos do leste europeu, principalmente tchecos, poloneses ou russos, despertaram a desconfiança da linha dura militar. Daí sua prisão.

             Essas lembranças vêm a propósito da exibição do filme "Tudo por amor ao Cinema", documentário biográfico de Cosme, realizado por outro amazonense igualmente vidrado em cinema: Aurélio Michiles, autor dos documentários "Que viva Glauber" e "O cineasta da selva", este sobre Silvino Santos, amazonense como Cosme e Aurélio, pioneiro do cinema brasileiro.

            O leitor pode ver o trailer de "Tudo por amor ao cinema" em http://www.youtube.com/watch?v=P5U24Gsiv.

            No filme a gente encontra este lamento de Cosme, referindo-se à Cinemateca do MAM: "Todos aqueles filmes que eu via quando era garoto, estão aqui no nosso acervo. E sabe o que acontece? Eu não tenho tempo de ver nenhum..."


            O filme de Michiles faz parte do festival Tudo é Verdade, edição de 2014. 

sexta-feira, 21 de março de 2014

EVOÉ BELLINI, CAMPEÃO DO MUNDO!

EVOÉ BELLINI! 


Bellini, aqui na terra sempre foi uma estrela, mas agora virou uma constelação cósmica.


Faz 15 anos que sou vizinho deste deus do futebol, a primeira vez que o encontrei num posto de gasolina em frente ao Hospital Samaritano, não acreditei...Será ele mesmo? Fiquei observando-o. Quando ele se afastou aproximei-me da pessoa com quem conversava... A resposta foi positiva. 

Todos os dias passava no posto, e ele sempre estava naquele mesmo lugar. Um dia...misteriosamente nunca mais o vi. E ficava me perguntando, cadê Belini? Pensei entrevistá-lo para o meu doc "Bairro Higienópolis - Um Recorte do Mundo", mas ele havia sumido. 
foto: Ormuzd Alves/Folha Imagem

Mas agora entendi tudo. A maldita doença que zera o HD da memória o havia atingido em cheio.

terça-feira, 18 de março de 2014

SILVINO SANTOS - UM REGRESSO 2



Acabo de retornar de Sertã/ Cernache do Bonjardim - 

Portugal, quantas emoções!


Depois de viajar desde a Irlanda - aonde estive 

entrevistando, pesquisando e filmando em diversos 

lugares visando ao meu próximo projeto: "Um Herói 

de Três Mundos" -, Londres, Lisboa e daí de 

automóvel até Sertã, estávamos exaustos, mas logo 

fomos introduzidos no evento oficial em homenagem 

ao pioneiro do cinema. 



O lugar escolhido foi um antigo 

mosteiro, agora restaurado, transformado num 

luxuoso e moderno hotel, a antiga capela foi o

espaço escolhido para exposição de fotos e 

lançamento do livro "Silvino Santo - Um Regresso".

Encontrava-se presente o escritor amazonense 

Márcio Souza, presidente do Conselho de Cultura da 

cidade de Manaus, Claudia André, vereadora de 

Sertã, João Paulo Macedo, curador do evento, João 

Manuel Guimarães Santos Serra, sobrinho-neto de 

Silvino Santos e do presidente da Câmara Municipal 

da Sertã (correspondente ao Prefeito no Brasil) José 

Farinha Nunes que resumiu a importância deste 

regresso em poucas palavras: 


"Talvez pela distância que nos separa do Brasil, por esse mar imenso que lhe roubou parte da obra mas que lhe abraçou os sonhos de menino, só há pouco tempo os portugueses tomaram consciência da dimensão do legado de Silvino Santos.


Quando iniciei o projeto em filmar a vida deste 

pioneiro, incentivado que fui por Cosme Alves Netto, 

não tinha em mente que chegaríamos tão longe,

desde 1997 quando estreei o filme "O Cineasta da 

Selva" no Festival de Cinema de Brasília, 

ganhou vários prêmios, desde aí muitas coisas boas 

aconteceram, mas esta que aconteceu (e) aqui na 

cidade Cernache do Bonjardim / Sertã - Portugal nos 

traz uma emoção muito especial: Um filme causa 

uma onda na calmaria das águas da memória 

esquecida, Silvino Santos (1886-1970) um 

incógnita em suas terras, agora é um filho 

predileto. 



Que homenagem!

COSME: CHEIRO DE CINEMA

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COSME: CHEIRO DE CINEMA
José Ribamar Bessa Freire
16/03/2014 - Diário do Amazonas


Grande Otelo: - O que é isso, rapaz?
Ankito: - (farejando o ar)... O cheiro...Você não sente?
Grande Otelo: Que cheiro?
Ankito: Cheiro de cinema!!!  Como gosto deste cheiro!
(Diálogo no filme "Pé na Tábua")
Com este aroma, uma mistura de memórias e saudades de infância,  o cineasta amazonense Aurélio Michiles abre seu documentário "Tudo por amor ao cinema" sobre outro amazonense, Cosme Alves Neto (1937-1996), o grande curador da filmografia nacional responsável pelarecuperação e conservação de filmes. O longa-metragem de Michiles (SP, 97 min. 2014) foi escolhido para abrir no Rio a 19ª edição do festival "É Tudo verdade", no dia 4 de abril, no Espaço Itaú Cinema em Botafogo. Lá, ele pinta o retrato de quem respirava cinema.
O cheiro de cinema vai marcar também, nesta quarta-feira (19/03), outro evento que ocorrerá no Programa de Pós-Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro(UNIRIO), na Urca, com a defesa da tese "Em territórios do patrimônio cinematográfico: cinema, memória e patrimonialização" da doutoranda Renata Queiroz Soares. Ela aborda, num texto acadêmico, o mesmo tema que Michilles registra em imagens: o conceito de patrimônio cinematográfico e sua importância para a memória, a história e a identidade nacional.
O guardião do cinema
Não vi ainda o documentário de Michiles que, também embriagado pelo cheiro de cinema, já nos deu “Que viva Glauber!” (1991) e “Cineasta da selva” (1997). No entanto, troquei figurinhas com ele e li "O guardião do cinema" (O Globo 11/03) uma resenha feita por André Miranda, que reproduz depoimentos sobre Cosme, lembrado como uma figura mítica, na fala de Eduardo Coutinho, ou como o guardião do cinema brasileiro, segundo Cacá Diegues, ou ainda vinculado ao cinema do mundo inteiro na voz de Nelson Pereira dos Santos.
Michiles entrevistou 67 pessoas no Rio, Manaus, São Paulo, Mossoró, Havana e Lisboa, cujas falas são alternadas com cenas de 70 filmes. Alguns entrevistados como Ana Callado, Arnaldo Carrilho e Alberto Shatovsky destacaram a militância política de Cosme, que foi preso duas vezes pela ditadura, a primeira logo depois do golpe militar, em 1964, quando estava de casamento marcado. Ficou preso seis meses e presenciou a queima do negativo do "Encouraçado Potemkin" (1915) sobre a revolução russa, que ele exibiu clandestinamente inúmeras vezes.
No momento em que o país se organiza para um ajuste de contas com o passado, rememorando os 50 anos do golpe militar, é importante lembrar a atuação política de Cosme, primeiro como militante da Juventude Universitária Católica (JUC) e depois da Ação Popular (AP), na luta contra a ditadura, o que marcou sua trajetória impregnada de religiosidade, segundo Carrilho, para quem "ser cristão e marxista dá um problema miserável porque ambos são messiânicos”.
A Cinemateca do Museu de Arte Moderna - diz Shatovsky - foi "um polo de resistência cultural" liderada por Cosme, que como seu curador desde 1965 buscava guardar todos os filmes possíveis, alguns com nomes trocados. Eduardo Coutinho, falecido recentemente, lembra que as primeiras sequências de "Cabra marcado para morrer", rodada nos anos 1960, só conseguiram ser retomadas e finalizadas em 1984 porque ficaram escondidas por Cosme na Cinemateca, guardadas com o título 'Rosa do Campo' para despistar a repressão.
Patrimônio cinematográfico
E aqui se cruzam o filme de Michiles com a tese de Renata Soares que, além de fazer uma varredura crítica na bibliografia sobre o tema, entrevistou nove pesquisadores da área de cinema. Um deles, Hernani Heffner, conservador-chefe da Cinemateca do MAM, contou para ela que "os dois nomes mais importantes para a memória cinematográfica brasileira foram o Paulo Emílio Sales Gomes e o Cosme Alves Netto, curador durante 40 anos, consultor de inúmeros festivais, um 'empreendedor da memória', que dedicou sua vida ao cinema".
Afinal, o que vem a ser esse patrimônio cinematográfico que Cosme Alves Netto defendeu com tanta paixão? A tese problematiza o conceito a partir de algumas perguntas: quem determina o que é patrimônio cinematográfico? Quais os critérios para decidir o que preservar e o que descartar? Que discursos o instituem? Qual seu impacto na construção da identidade do país? Por que é preciso salvar a produção cinematográfica? Qual a relação entre cinema e memória.
Já que custa muito caro a preservação de filmes, física e quimicamente frágeis e vulneráveis à ação do tempo, a questão é saber se vale a pena fazê-lo? A tese descreve o movimento em defesa desse patrimônio dentro e fora do Brasil e analisa as ações da UNESCO que aprovou, em 1980, a Recomendação para a Salvaguarda e Proteção de Imagens em Movimento, ou seja, aquilo que Cosme vinha fazendo desde os anos 60.
- O cinema surgiu como atividade mercantil de feição industrial, cuja prática é usar e jogar fora. Não foi diferente com o cinema. Por que preservar obras que já não rendem mais lucro? - se pergunta ironicamente Hernani Heffner.  Ouvido por Renata, o professor da UFF João Luiz Vieira calcula que entre 70 a 90% da produção mundial do cinema mudo está desaparecida.
Outro entrevistado, Carlos Calil conta que viveu coisas horríveis com filmes apodrecendo dentro de latas, que quando você abre, não tem mais o que fazer, "é como o cirurgião que abre o paciente e o câncer já tomou completamente tudo, você fecha a barriga e espera o cara morrer, a situação é muito parecida".
Contra-história
Na discussão sobre o que é patrimônio cinematográfico, Carlos Calil exemplifica com filmes etnográficos: "Há filmes que o Levi-Strauss fez no Brasil que não são muito conhecidos e nem são tecnicamente bons, ele era um grande pensador, não um cineasta. Mas esses registros da aldeia Kadiweu pertencem ao patrimônio cinematográfico brasileiro. Patrimônio não é apenas obra estética, acabada, não é só artístico, tem que ser simbólico". O filme de Tomas Reis "Ao Redor do Brasil" que documenta Rondon numa aldeia também é importante para entender o Brasil.
A tese acompanha as mudanças no conceito de patrimônio histórico, desde quando Boleslaw Matuszewski, em 1898, três anos depois da invenção do cinematógrafo, escreveu o artigo "Uma nova fonte histórica", onde defende que a fotografia em movimento seria uma forma de se estudar e conhecer o passado. A autora considera a relação entre patrimônio cinematográfico e a memória social em bases singulares, citando o historiador Marc Ferro: "a câmera desvenda o segredo, apresenta o avesso de uma sociedade, seus lapsos. Ela atinge suas estruturas".
- Um filme pode atualizar um acontecimento passado e jogar luz sobre personagens e fatos, possibilitando um novo olhar sobre eles, pode funcionar como uma chave de ativação da memória - escreve Renata, recorrendo a Jeanne Marie Gagnebin para quem "o filme ajuda assim na constituição de uma contra-história não oficial, liberada parcialmente desses arquivos escritos que muito amiúde nada contém, além da memória conservada por nossas instituições".
Faz sentido. Cosme Alves Netto certamente gostaria de ler isto, porque sua vida foi a luta, com riscos, para preservar um acervo que destoa da história oficial. Esse é o legado que ele nos deixou. De qualquer forma, apoiada em seus entrevistados, a doutoranda mostra que se trata de um conceito complexo, que não pode ser usado de forma inconsequente, sem um questionamento teórico.
P.S.1 - Renata Queiroz Soares: Em territórios de patrimônio cinematográfico: cinema, memória e patrimonialização. Tese de doutorado.PPGMS - UNIRIO. Banca: Regina Abreu (orientadora), Amir Geiger, Analice Martins, Manoel Ferreira Lima, Maria Cecilia Londres e Vera Dodebei.
P.S. 2 - Ver texto REVIVENDO COSME (2006) http://www.taquiprati.com.br/cronica.php?ident=163
  

TUDO POR AMOR AO CINEMA - CARTAZ

Mais um gostinho para os desejosos em assistir Tudo Por Amor Ao Cinema, a história de Cosme Alves Netto (1937-1996), roteirizado e dirigido por Aurélio Michiles. Numa produção de Aurora Filmes, Olhar Imaginário e Imagem Ceuvagem. Selecionada para a abrir o Festival de cinema É Tudo Verdade/ It's All True, dia 04 abril, as 20h30, Espaço Itaú de Cinema, Botafogo, Rio de Janeiro. Sejam bem vindos!



TRAILER - TUDO POR AMOR AO CINEMA


"TUDO POR AMOR AO CINEMA" a história do Cosme 
que fez dos filmes a história da sua vida abre É Tudo 
Verdade/ It's All True, dia 4 abril, as 20h30 Espaço 
Itaú de Cinema- Botafogo, Rio de Janeiro.

* Leia a matéria e acesse o link-trailer.


"Livre-pensar é só pensar" Millor Fernandes

www.tudoporamoraocinema.com.br

Minha foto
Nasceu em Manaus-AM. Cursou o Instituto de Artes e Arquitetura-UnB(73). Artes Cênicas - Parque Lage,RJ(77/78). Trabalha há mais de vinte anos em projetos autorais,dirigindo filmes documentários:"SEGREDOS DO PUTUMAYO" 2020 (em processo); "Tudo Por Amor Ao Cinema" (2014),"O Cineasta da Selva"(97),"Via Látex, brasiliensis"(2013), "Encontro dos Sabores-no Rio Negro"(08),"Higienópolis"(06),"Que Viva Glauber!"(91),"Guaraná, Olho de Gente"(82),"A Arvore da Fortuna"(92),"A Agonia do Mogno" (92), "Lina Bo Bardi"(93),"Davi contra Golias"(94), "O Brasil Grande e os Índios Gigantes"(95),"O Sangue da Terra"(83),"Arquitetura do Lugar"(2000),"Teatro Amazonas"(02),"Gráfica Utópica"(03), "O Sangue da Terra" (1983/84), "Guaraná, Olho de Gente" (1981-1982), "Via Láctea, Dialética - do Terceiro Mundo Para o Terceiro Milênio" (1981) entre outros. Saiba mais: "O Cinema da Retomada", Lucia Nagib-Editora 34, 2002. "Memórias Inapagáveis - Um olhar histórico no Acervo Videobrasil/ Unerasable Memories - A historic Look at the Videobrasil Collection"- Org.: Agustín Pérez Rubío. Ed. Sesc São Paulo: Videobrasil, SP, 2014, pág.: 140-151 by Cristiana Tejo.