sábado, 12 de fevereiro de 2011

PRAÇA TAHRIR (2011) E A PRAÇA DA SÉ (1984)






Ontem, 11 de fevereiro, enquanto navegava na internet acompanhando a queda da Ditadura Egípcia (Hosni Mubarak) após 30 anos de poderes absolutistas, as imagens já haviam se fundido ao imaginário popular com milhões de manifestantes acampados na praça Tahrir (Cairo).

Surge na tela de luz branca e fria o rosto impávido do vice Omar Suleiman, ele afirma que o Ditador renunciou...Um alívio? A resposta é NÃO. Ora, Suleiman é general, comandou o serviço de segurança do Egito, portanto (vá lá, mesmo que tenha diferenças), ele se manteve por três décadas como parceiro da ditadura. Agora vêm a publica (depois de pressionados durante 18 dias pela população)... Lá estava novamente a Imagem recorrente de Suleiman, um rosto sem expressão, parecendo uma máscara.Um Sarney.

Pela minha cabeça vem muitas referências...sou interompido por meu filho de 9 anos, acostumado a ouvir narrativas políticas ele me pergunta:

"- Pai quando a ditadura no Brasil acabou tambem foi assim, o povo foi pra rua?"

Até então não havia surgido na minha memória essa referência imediata com a queda da ditadura brasileira.

"DIRETAS JÁ!". Praça da Sé, São Paulo- Capital, 25 de janeiro de 1984.

Sim, fazia vinte anos em que o Brasil encontrava-se sob um regime de exceção, o país encontrava-se comandado pelo general Figueiredo, típica caricatura do carioca machista falastrão, a sua língua solta contrariava a sua trajetória pessoal, havia sido nada menos que o chefe do todo-poderoso e onipresente SNI-Serviço Nacional de Informação, os olhos e ouvidos da ditadura.

Naquele dia 25 de janeiro, meio milhão de pessoas se reuniram no "marco zero" da capital paulista, no dia em se comemorava o aniversário da cidade, mas elas não estavam aí pra isso, foi uma multidão para mostrar que estávamos fartos dos desmandos da Ditadura, queríamos democracia, liberdade - fim da corrupção, da inflação e do desemprego.

Queríamos e almejávamos um mundo melhor, ao menos pra nós brasileiros cansados de levar porradas em todos os sentidos.

A noite quando milhões de brasileiros reuniram-se em seus lares para assisitr TV e se informar dos últimos acontecimentos no Brasil e no exterior, pensávamos que esta seria a chance do movimento das "Diretas Já!" cair no domínio do povo, mas que nada, grande foi a frustração quando o "Jornal Nacional" (TV GLOBO) não noticiou.

Aquela reunião de meio milhão cidadãos paulistanos exigindo uma mudança no cenário político do país viu-se sonegado, aliás uma decisão tomada em conluio entre o proprietário das Organizações Globo, o jornalista Roberto Marinho com a censura da ditadura brasileira.

Mas não pensem que aquela multidão reunida na praça Tahrir, no Cairo tambem não sofreu tentativas em torná-la invisível da maioria da população. A máquina repressiva da ditadura egípcia tentou fechar agências de noticias, prender, assassinar e expulsar jornalistas que faziam os registros daquele movimento que tinha superado todas as expectativas, suplantado as velhas lideranças religiosas, militares e dos tradicionais partidos políticos. Um movimento que têm como evidência a juventude e esta havia sido mobilizada através da rede mundial das infovias, não teve quem e como impedir que esses sinais virtuais se propagassem e se transformassem em fagulhas reais exigindo transformações.

Talvez nunca num curto espaço de tempo um ditador ficou tão popular e odiado mundialmente como Hosni Murabak.

Mantida a proporção dos fatos (Praça da Sé,1984 e Praça Tahrir, 2011), mas mantendo as mesmas exigências de mudança por democracia e liberdade, essas duas manifestações populares acabaram por acelerar a agonia tanto da ditadura brasileira como da egípcia de Hosni Mubarak.

O meu filho ainda faz uma última pergunta:

"- Pai, qual ditadura foi pior, a do Brasil ou do Egito?"

"- Nenhuma, todas são iguais. O importante é a liberdade e o fim de todas as ditaduras.

O Brasil dos meu filhos é uma democracia, mas o Sarney(Suleyman)permanece em nosso cotidiano como imagem recorrente de uma maldição.


8 comentários:

claudio disse...

O Mubarak foi empossado pelos Estados Unidos após o assassinato do Sadat, e sempre ficou no papel do lacaio norteamericano - assim como aconteceu com o Sadam Hussein, no Iraque, "inventado" pelas Star and Stripes na época da guerra contra o Iran, Khomeini e os ayatollahs. É curioso, pelomenos, notar como, quando todos esses fantoches não têm mais utilidade, de repente, dans l'espace d'un matin, os EUA tiram formalmente o apoio eo cara em questão vai para Sharm-el-Sheik ou para PQP... Mas não tiram, afinal,o poder, pois, como vc ressalta, Aurélio, o vice comeu e come o mesmo pão... Não é?

AURÉLIO MICHILES disse...

...é a maldição da múmia! Seria trash, tipo filme B caso não fosse realidade. O cara saiu do palácio carregando caixas com barras de ouro e mais de cem malas. Tudo combinado, ele agora, descansa em seu paraíso. Piada de mau-gosto, mas observemos o caso Sarney, homem permanece...ARENA, PDS, PMDB e vai...

Unknown disse...

O importante é que Mubarak saiu por pressão popular... Essa é a grande vitória do povo egípcio!
Um grande exemplo a ser seguido por nós brasileiros... a pressão popular é a melhor das armas...contra os desmandos!

AURÉLIO MICHILES disse...

Anete, nós já demonstramos várias vezes a capacidade de mobilização popular, inclusive as Diretas Já e o impeachment contra Collor...A questão que se coloca é quanto a herança malditas, as múmias que insistem em permanecer vivas no centro do Poder.

eliane motta, compartilhando disse...

a pressão popular tem agora um aliado "indomável": a internet. estivesse ela presente quando a globo, em 84, ignou o movimento, tudo seria diferente. a informação se alastra como fogo... e ninguém segura!

AURÉLIO MICHILES disse...

...vivemos aquela realidade imaginada nos anos sessenta- "aldeia global- isto faz a diferença, estaremos e permaneceremos conectados...

Anônimo disse...

Aurélio, só não pode trocar uma Ditadura pela outra, agora com os militares... (e o Sarney que por aqui ainda "reina": ninguém merece!)

Bacana seu post! Adicionei seu blog aos favoritos!

Beijos,

Juliana Hatoum

AURÉLIO MICHILES disse...

Democracia sempre foi uma conquista, mesmo em continentes declaradamente abertos ao dialogo tbm caíram no "encanto" de ditaduras: nazifascismo, estes que ainda hoje insistem em manter como assombração. Por aqui a gente vai levando...conquistando passo-a-passo a cultura democrática, veja até nos EUA que se declaram fiéis a esses princípios, ali viceja um ódio contra o OUTRO, e eles costumam resolver suas diferenças com assassinatos.

"Livre-pensar é só pensar" Millor Fernandes

www.tudoporamoraocinema.com.br

Minha foto
Nasceu em Manaus-AM. Cursou o Instituto de Artes e Arquitetura-UnB(73). Artes Cênicas - Parque Lage,RJ(77/78). Trabalha há mais de vinte anos em projetos autorais,dirigindo filmes documentários:"SEGREDOS DO PUTUMAYO" 2020 (em processo); "Tudo Por Amor Ao Cinema" (2014),"O Cineasta da Selva"(97),"Via Látex, brasiliensis"(2013), "Encontro dos Sabores-no Rio Negro"(08),"Higienópolis"(06),"Que Viva Glauber!"(91),"Guaraná, Olho de Gente"(82),"A Arvore da Fortuna"(92),"A Agonia do Mogno" (92), "Lina Bo Bardi"(93),"Davi contra Golias"(94), "O Brasil Grande e os Índios Gigantes"(95),"O Sangue da Terra"(83),"Arquitetura do Lugar"(2000),"Teatro Amazonas"(02),"Gráfica Utópica"(03), "O Sangue da Terra" (1983/84), "Guaraná, Olho de Gente" (1981-1982), "Via Láctea, Dialética - do Terceiro Mundo Para o Terceiro Milênio" (1981) entre outros. Saiba mais: "O Cinema da Retomada", Lucia Nagib-Editora 34, 2002. "Memórias Inapagáveis - Um olhar histórico no Acervo Videobrasil/ Unerasable Memories - A historic Look at the Videobrasil Collection"- Org.: Agustín Pérez Rubío. Ed. Sesc São Paulo: Videobrasil, SP, 2014, pág.: 140-151 by Cristiana Tejo.