O Museu de Arte de São Paulo - MASP está completando 68 anos. Talvez seja o prédio mais visível no cotidiano dos brasileiros; quem sabe depois do Congresso Nacional. Quase todos os dias o MASP aparece no noticiário das diversas mídias, tal foi a escolha da população paulistana por este espaço público como um lugar para demonstrar as suas inquietações.
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MASP- av. Paulista |
É comum vê-se um solitário ou multidões protestando em frente ou debaixo do "vão livre". Mas ali, dentro do MASP, encontra-se um tesouro, como consequência do encontro entre o casal Lina e Pietro Maria Bardi com um dos empresários mais poderosos dos anos 40/50/60 (Assis Chateaubriand). O resultado é um acervo de obras de artes que somam 8 mil peças: Van Gogh, Delacroix, Gauguin, Renoir, Picasso, Monet, Cèzanne, Botticceli, Modigliani, Matisse, Chagall, Bruguel, Hieronymus Bosch, Ticiano, Lasar Segall, Portinari, Velazquez...
Não gostaria de ficar escrevendo aqui sobre a obviedade desta milionária coleção, mas, contar-lhes uma história sobre duas personalidades que fizeram parte da história do MASP, refiro-me a Luiz Sadaki Hossaka e Leon Cakoff. Cada um em sua função contribuíram o mais que puderam com o trabalho desenvolvido pelo casal Bardi (Lina e Pietro). Não que tenha existido outros personagens, mas opto para relembrar estes dois com quem tive um contato afetivo.
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Glauber Rocha, Lina Bo Bardi e Luiz Hossaka - Exposição "Bahia no Ibirapuera", 1959 |
O Luiz ( "japonês") trabalhou no museu durante 59 anos, quando faleceu, em 2009, aos 81 anos. Esteve presente em suas atividades quase desde a sua fundação, chegou como um estudante, vindo do interior para integrar um curso de artes promovido pelo museu, logo depois tornou-se necessário ao casal Bardi. Fazia de um tudo, secretário, assistente, motorista, fotógrafo (é dele o acervo fotográfico sobre a construção até a inauguração do MASP - avenida Paulista). Quando a Lina ou o professor Bardi viajavam juntos ou sozinhos ao interior do Brasil, era o Luiz quem os acompanhava. Quando uma ilustre figura artística ou política vinha visitar o museu, Luiz sempre estava a postos com a sua máquina fotográfica. Ele também viajava sozinho ao exterior, por exemplo, as primeiras viagens ao Japão articulando os interesses museológicos entre aquele país e o Brasil.
Luiz, aparentemente fechado, mas quando se ganhava a sua confiança...aí era o paraíso. Mantive com ele uma amizade de todo sempre, houve uma certa época nas décadas 80 a 90 que tínhamos encontros periódicos nos finas da tarde para tomar cerveja. Nestas ocasiões, ele se revelava uma fonte inesgotável dos causos sobre o Museu, uma autêntica testemunha ocular. Luiz tinha um lugar privilegiado para confirmar sobre lendas e mitos que envolvia a estratégia do professor Bardi e Assis Chateaubriand para formar a coleção do MASP. Luiz, também, entre muitas coisas foi o pioneiro em fomentar a fotografia, por incentivo do professor Bardi instalou um laboratório fotográfico dentro do museu. Tinha um gosto apurado e sabia identificar o potencial de um jovem artista. Neste sentido era generoso. Ele era o "Tigrão" como chamava-o Leon Cakoff, outra figura que fez história no MASP.
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Pietro Bardi - garoto propaganda da Mostra Internacional de Cinema SP |
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Leon Cakoff |
Leon, ainda jovem, em 1974 entrou no museu como programador do Departamento de Cinema do MASP e na comemoração dos 30 anos (1977) do Museu, ele criou a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo que cresceu tanto que teve que sair do MASP e seguir com as suas próprias pernas. Mesmo que o Leon tenha declarado que o Professor Bardi tinha ciúmes da Mostra, ele deixou-se fotografar carregando um cartaz fazendo propaganda da Mostra nas ruas centrais de São Paulo. E aqui, entra o acaso novamente.
Em 1983, depois de ter realizado 2 documentários sobre os índios Sateré-Mawé, em visita à São Paulo tive a oportunidade de exibi-los numa sessão privada na Casa de Vidro (residência dos Bardi). Ao final, a Lina e o professor Pietro comentaram que mais pessoas deveriam conhecer estes trabalhos e sugeriu que fosse no dia seguinte ao Museu. Quando cheguei lá, fui recebido pelo Leon, ele pediu para assistir e perguntou-me se tinha uma sinopse, fotos e cartaz para a divulgação. Como não havia previsto esta possibilidade tive que correr atrás. Com a arte final do cartaz nas mãos levei ao conhecimento do Leon e que por sua vez levou-o ao professor Bardi e que chamou o Luiz Hossaka. E, eles, por fim, aprovaram. Saí do MASP cantando e dançando de felicidades. Mas o melhor viria em seguida, ganhei a amizade tanto do Leon como do Luiz.
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cartaz dos 2 documentários exibidos no auditório do MASP |
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Yeda Oliveira, Aurélio Michiles e Luiz Hossaka, 2008 |
Em 2000, o Leon sugeriu-me realizar um documentário sobre o "Tigrão", a idéia era registrar os causos relatados em nossas conversas com o Luiz, ele era a memória viva do Museu. A Lina e o professor Bardi já haviam partido...restava o ponto de vista desta privilegiada testemunha. Infelizmente não aconteceu. Todos já partiram e estou aqui contando esta historia para comemorar os 68 anos do MASP. Como escreveu Leon, num texto de despedida, em 2011:
"A memória, meu único capital."
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