domingo, 18 de novembro de 2007

AMAZONAS FILM FESTIVAL E O DESCONHECIMENTO GLOBAL


Ao retornar de Manaus, aonde fui participar do 4º. Amazonas Film Festival - Filme de Aventura(9 a 15 nov.), trago comigo, mais uma vez uma série de indagações sobre as questões ambientais que envolvem a região amazônica e o seu imaginário no cinema.

Todo festival de cinema tem uma marca que o faz distinguir-se dentre tantos outros, por exemplo, o festival do Rio de Janeiro é uma vitrine de negócios, o de Brasília, o mais antigo do país, leva a marca da politização e por aí vai. Isto faz com que os produtores e distribuidores procurem aquele que melhor convier a visibilidade mercadológica do seu filme. Esta é uma busca de todos os eventos do gênero audiovisual.

O que significa para um realizador exibir o seu filme no glamuroso festival de cinema em plena selva amazônica, cujo templo maior é o Teatro Amazonas?

TAPETE VERMELHO

No seu tapete vermelho desfilaram os participantes, eles vieram de todas as partes do país e do mundo e aqui eles ficam embasbacados com a paisagem e a presença demográfica, antes acreditavam encontrar um lugar de tribos indígenas fugidias, mas ao contrario, são levados a conversar com realizadores locais.

É verdade, a maioria ignorava a filmografia dos visitantes, por exemplo, no debate com Jean-Jacques Annaud(Preto e branco em cores, A guerra do fogo, O nome da rosa) e John Boorman (A floresta das esmeraldas, Esperança e Gloria, Excalibur), ao questionarem na platéia quem os conhecia, apenas uma pessoa (platéia lotada) levantou o braço. Pergunto isso tem importância? Esses visitantes também não desconheciam a realidade amazônica? E nem por isso os tornam menos importantes. Neste encontro, tanto um como o outro, passou a se conhecerem. Inclusive depois da resposta solitaria da plateia, eles indagaram quem tinha algum registro audiovisiual no Youtube, uma outra pessoa afirmou possuir e imediatamente passaram a conversar sobre as possibilidades das novas mídias.

A existência deste festival de cinema é o que conta, e é justamente isso que o faz cada vez mais um evento referencia, aonde se pode discutir as questões relacionadas as mudanças globais, neste sentido o Amazonas Film Festival, afirma-se como um acontecimento cinematográfico de interesse mundial.

BUZZ ALDRIN * APOLLO XI

A presença do astronauta Buzz Aldrin, sim um dos primeiros humanos a pisar na Lua, passou quase despercebida para a maioria dos freqüentadores e também para os habitantes da cidade de Manaus. Aliás, a imprensa local fez comentários com reticências ao acontecimento. Ela dizia que não havia celebridades importantes, segundo eles, a homenagem à atriz Gloria Pires, num evento cinematográfico? Insinuando preconceitos entre cinema e a televisão. Quanta injustiça ou desinformação.

Nem por isso os freqüentadores do Festival não puderam conhecer a realidade de outros lugares do planeta, como por exemplo:"Luky Miles" (Austrália), "Souds of Sand" (Bélgica/França),"Before the Flood" (Holanda), "Bushman's secret" (áfrica do sul),"Chernobyl Reclamaimed - na animal takeover (Holanda),"The Mud" (Singapura),"Wild Mongólia" (Áustria), "A incrível historia de Coti - Rambo do São Jorge" (Manaus-Brasil), "Navegar Amazônia"( SP-Brasil), "O Signo da Cidade" (SP-Brasil), "Nas asas do condor" (Manaus-Brasil). Esses e muitos outros filmes internacionais e nacionais deram significado e conteúdo.

Não poderíamos deixar de comentar que este ano, o presidente de honra foi Cacá Diegues, ele que no final dos anos setenta realizou o filme "Bye,Bye Brasil", literalmente um adeus perplexo e visionário ao país que se desnudava atônito aos desafios simultaneos da era digital.

IDIOSSINCRASIAS E PANACÉIAS

A Amazônia tem sido explorada como parte das idiossincrasias e panacéias alimentada pela imaginação da humanidade. Aliás, era e é muito comum nos filmes de ficção científica e horror das décadas de 40 e 50, (ainda hoje) a utilização dessa enorme e intrigante região desconhecida como tema, numa espécie de reinvenção. Podemos citar alguns destes filmes: "Delírio de um Sábio" (Dr. Cyclops, 40), "O Monstro da Lagoa Negra" (The Creature From the Black Lagoon, 54), "Curuçu, o terror do Amazonas" (Curuzu, the beast of the Amazon, 1956), "O Mundo Perdido" (The Lost World, 60) e Um Lobisomem na Amazônia (BRA,2006).

FASCÍNIO DA HUMANIDADE

A última floresta tropical em pé, esta que abriga um imenso pulmão verde redutor de carbono contra o aquecimento global, a maior reserva de água doce do planeta, a biodiversidade que desafia a finitude das descobertas, sociedades neolíticas e conflitos por interesses diversos das suas riquezas naturais serve de inspiração para os imaginativos roteiristas, estes a incluem como cenário de civilizações perdidas, mundos ocultos, animais pré-históricos que sobreviveram ao longo do tempo, laboratórios de cientistas loucos, tráfico de recursos naturais, e todos os tipos de intrigas que fascinam a humanidade.

Nessa quarta rodada do Amazonas Film Festival - filme de aventura, trouxe com ele significados emblemáticos das questões que vivenciamos hoje no planeta, ao mesmo tempo em que ele acontece tendo como mostruário de notáveis realizações cinematográficas de todas as partes do mundo, inclusive realizadores locais. Esta mostra de filmes (sem preconceitos) se coloca como a própria diversidade da flora e fauna amazônica, procura disponibilizar aos olhos contemporâneos a oportunidade de se fazer comparações e reflexões sobre como se tem inventado um imaginário amazônico entre nós e o outro, entre o autóctone e o estrangeiro - o estranhamento do desconhecimento e das descobertas.

PIONEIROS DAS IMAGENS AMAZÔNICAS

Mas não podemos esquecer daqueles que contribuíram com a sua curiosidade encontrando respostas e que deixaram um legado empreendedor e pioneiro (Silvino Santos, Theodor Koch-Grünberg, Major Luiz Thomaz Reis). Mesmo daqueles que ao visitarem-na foram tomados pela ambição do poder, chegando a loucura megalômana (Aguirre e Fitzcarraldo).

Conhecer a Amazônia através do imaginário audiovisual, é uma experiência que vale a pena, mesmo que estejamos nos comovendo com a aventura da pequena indiazinha "Tainá", do desenho animado "Sinfonia Amazônica" ou incomodados com os perturbadores filmes "Terceiro Milênio", "Iracema - uma transa amazônica". Podemos citar ainda os filmes realizados ainda naquele período de pré-guerra mundial, por exemplo, a versão amazônica da Alemanha hitlerista no filme "O inferno verde" (Kautschuk,1938) ou a superprodução hollywoodiana "O fim do rio" (The end of the river, 1947). Os filmes de pós-guerra "Os Bandeirantes" (Rio Negro, 1961), "O homem do Rio" (L'homme de Rio,1964), "A floresta das esmeraldas"(The emerald forest,1985), "Brincando nos campos do senhor" (At play in the fields of the Lord,1991). E, finalmente o olhar amazônico num filme de Glauber Rocha ("Amazonas, Amazonas",1966).

ARIADNE-AMAZÔNIA

O cinema, essa linguagem privilegiada do século passado, tem a capacidade para desenrolar o mítico novelo de Ariadne-Amazônia ("ilusão do paraíso") neste instigante labirinto do documentário e da ficção. E neste Festival Mundial do Filme de Aventura, entenda-se "aventura" com o parte intrinseca do "fazer cinematografico" e a "Amazonia" como uma locação generosa para colocarmos em prática toda a imaginação das nossas desventuras neste planeta ameaçado.

Aurélio Michiles aureliomichiles@gmail.com novembro, 2007.

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"Livre-pensar é só pensar" Millor Fernandes

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Minha foto
Nasceu em Manaus-AM. Cursou o Instituto de Artes e Arquitetura-UnB(73). Artes Cênicas - Parque Lage,RJ(77/78). Trabalha há mais de vinte anos em projetos autorais,dirigindo filmes documentários:"SEGREDOS DO PUTUMAYO" 2020 (em processo); "Tudo Por Amor Ao Cinema" (2014),"O Cineasta da Selva"(97),"Via Látex, brasiliensis"(2013), "Encontro dos Sabores-no Rio Negro"(08),"Higienópolis"(06),"Que Viva Glauber!"(91),"Guaraná, Olho de Gente"(82),"A Arvore da Fortuna"(92),"A Agonia do Mogno" (92), "Lina Bo Bardi"(93),"Davi contra Golias"(94), "O Brasil Grande e os Índios Gigantes"(95),"O Sangue da Terra"(83),"Arquitetura do Lugar"(2000),"Teatro Amazonas"(02),"Gráfica Utópica"(03), "O Sangue da Terra" (1983/84), "Guaraná, Olho de Gente" (1981-1982), "Via Láctea, Dialética - do Terceiro Mundo Para o Terceiro Milênio" (1981) entre outros. Saiba mais: "O Cinema da Retomada", Lucia Nagib-Editora 34, 2002. "Memórias Inapagáveis - Um olhar histórico no Acervo Videobrasil/ Unerasable Memories - A historic Look at the Videobrasil Collection"- Org.: Agustín Pérez Rubío. Ed. Sesc São Paulo: Videobrasil, SP, 2014, pág.: 140-151 by Cristiana Tejo.